I don't wanna be kept, I don't wanna be caged, I don't wanna be damned, oh hell I don't wanna be broke, I don't wanna be saved, I don't wanna be S.O.L. (Neon Tiger, The Killers)

Saturday, February 11, 2012

A Revolução dos Signos

Era uma vez um mundo em que havia vários animais. Nele girafas, king-kongs e elefantes viviam em perfeita harmonia e todo mundo se chamava pelos nomes que bem entendessem. 

Até que um dia javalis resolveram que girafas eram animais perfeitos. Os animais mais altos, para pegar as folhas mais altas, das árvores mais altas. Com suas presas enormes e afiadas eles passaram a obrigar dezenas de milhares de girafas a pegar desde as folhinhas mais novas para seus filhotes até  folhas mais exóticas para suas fêmeas. Girafas bebê eram utilizadas para alcançar os arbustos com flores tenras e doces e girafas idosas alcançavam para os javalis as frutas que eles eram incapazes de colher. 

Girafas eram vendidas e trocadas por todo o tipo de coisa ou privilégio. Uma fruta mais apetitosa, um local mais aprazível à sombra, uma brecha melhor no lago para beber água.

Em pouco tempo girafa se tornou sinônimo de trabalho árduo e alta produtividade, sem trocadilhos, por favor. E, por outro lado, se tornou designação daquele que serve a todos, e é ameaçado por todos. Durante anos girafas serviram os javalis, e, por meio das trocas, toda a selva. 

O anos passaram e alguns animais indignados com a condição terrível a que eram submetidas as girafas conseguiram que aquele absurdo terminasse. Ainda assim, durante muito tempo as girafas sofreram discriminação em diversos aspectos. Altos índices de violência estavam associados à manutenção de girafas em serviço, com o perdão do jogo de palavras, e esta se perpetuou após sua libertação.

Abusos foram cometidos contra as girafas ao redor de toda a selva. E elas demoraram muito para reencontrar seu lugar na cadeia da vida selvagem. Depois de anos de luta, as girafas conseguiram sua libertação total, e conseguiram que seu nome fosse associado ao respeito que mereciam. Nunca mais uma girafa teve que andar com a cabeça acima da multidão para não ter que olhar nos olhos de seus pares de floresta. Novamente, perdão pelo trocadilho, ainda que com alguma graça.

Humanos vieram. E todos os animais acharam estranho. Após algum tempo passaram a viver entre os animais. Os animais viam seus costumes e achavam esquisitíssimo. Mas estranhos os humanos já aparentavam ser e andar em duas pernas parecia ser o menor de seus problemas. 

Passaram a sujeitar os animais. Prendê-los à sua vontade. Os animais se surpreenderam, resistiram, mas os humanos tinham armas. Assim, foram destinados ao trabalho. Aos locais para apreciação pública. Em pouco tempo os humanos já se comparavam aos animais, atribuíam a si características destes. 'Seu porco', o porco se indignava. 'Seu macaco', o macaco dava de ombros.
Até um dia, em que em um zoológico, em algum lugar, um humano apontou para um animal e para um amigo e gritou : - Girafa!!!

Em poucos minutos, sete ou oito girafas de cerca de vinte metros de comprimento investiram contra os humanos á sua volta. Com seus cascos afiados e seus pescoços musculosos, aperfeiçoados em séculos de trabalhos pesados arrancaram membros, esmigalharam crânios, partiram vértebras. 

Ao final do dia. Todos os animais do zoológico, enfim libertos,  repousavam calmamente entre os despojos sangrentos daquela tarde. Girafas mascavam suas folhas, leões devoravam os restos da luta da tarde, macacos balançavam nas árvores próximas. 

Apenas o javalis não saíam de suas tocas. Eles, assim como as girafas, tinham plena consciência do significado das palavras, e de uma delas em especial, memória.

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