Ele saiu, lágrimas e olhar arrependido.
Já não havia o que dizer.
As palavras já não condiziam com os atos há tempos.
Ela suava levemente, seu lábio superior tremia
Ouvira tudo e só o que restara era uma raiva fina e doce.
Doce e enjoativa, como aqueles doces baratos que comemos escondido aos montes quando criança
Que nos deixam com o estômago enjoado e uma indefinível dor de cabeça. A ressaca moral pelo almoço perdido, o trabalho da mamãe e as criancinhas da África.
Ela quisera muito acreditar que tudo o que passara
Tudo o que não fora e o que não vivera
Eram culpa de uma súbita incapacidade mental que o acometia a cada vez que tinha que fazer algo que havia dito que faria
"Não pensei"-- dizia ele. "Não importa!" -- dizia ela - "Não mais..."
As palavras doces de há dois dias atrás ecoavam em seus ouvidos como uma piada antiga e de mau gosto
O abraço cênico. O sexo triste. Quase estranhos, quase os mesmos de tão conhecidos.
Ela quisera acreditar. Mas já acontecia. O óbvio real ululante de tempos atrás.
Ela queria muito que fosse verdade. Mas a raiva já não a deixava só.
O medo de estar só não passava mais através de seu corpo.
Ele fizera o que fizera, porque assim o quis. Dizia apenas que não haver pensado.
Penso, logo existo, será que aquele que amara existiria?
Ele não fizera o que deveria, também por vontade própria. E dizia a si mesmo que fora levado pelas circunstâncias. Até que ponto entrar ou não na esteira das circunstâncias é uma escolha?
Dizia que se sentia só e que não podia viver sem ela. Ela se perguntava se ele pensava ou existia nas coisas que dizia.
Amor, Circunstâncias, Solidão...
Ela até quisera acreditar, mas, dizer que se é levada pelo amor, não é o mesmo que dizer que não se pensou no óbvio por conta das circunstâncias?
Ela sorri tristemente e deixa o parque, ele ainda tenta dizer algo, não entende ainda que essa era sua vontade. Ela seguia, mastigando aos pouquinhos sua raiva-doce.
O parque fica silencioso aos poucos, a tarde cai violeta no asfalto cinza da calçada em volta.
Os gramados recebem sedentos os últimos raios ...
A fonte onde os passarinhos tomam seu banho vespertino já está deserta.
Cupido decide, então, que é hora de parar de molhar as plantas.